Dezenas de jovens participantes do projeto Meninas em Movimento ocuparam ruas da Região Metropolitana do Recife durante os atos do 8 de março pelo Dia Internacional da Mulher. As adolescentes de diferentes territórios se reuniram nas principais manifestações locais para divulgar a campanha “Todas Juntas Vencem”.

Texto: Aline Vieira Costa
Fotos: Ivan Melo

Dezenas de jovens participantes do projeto Meninas em Movimento ocuparam ruas da Região Metropolitana do Recife durante os atos do 8 de março pelo Dia Internacional da Mulher. No Recife e no Cabo de Santo Agostinho, adolescentes de diferentes territórios se reuniram nas principais manifestações locais para divulgar a campanha “Todas Juntas Vencem”, que busca empoderar meninas e mulheres para o enfrentamento à violência e à exploração sexual de crianças e adolescentes.

O projeto é uma realização da Actionaid em parceria com as organizações Casa da Mulher do Nordeste (CMN), Centro das Mulheres do Cabo (CMC) e Etapas, com patrocínio da Petrobras e do Governo Federal por meio do Programa Petrobras Socioambiental.

No Recife, as meninas dos territórios do Ibura e Passarinho participaram da marcha que partiu do Parque Treze de Maio, no Centro, e se dirigiu ao Palácio do Campo das Princesas, sede do governo estadual, com o objetivo de levar reivindicações de mulheres pernambucanas em um documento chamado “Manifesto Feminista 8M”.

O foco de atuação das meninas do Ibura junto com a Etapas foi na concentração do público no parque. Lá, as elas confeccionaram cartazes, se dividiram em pequenos grupos e fizeram as atividades de multiplicação da campanha, divulgando informações sobre prevenção e meios de fazer denúncias.

“Elas também fizeram registros em foto e vídeo para compartilharmos internamente a experiência da abordagem, entendermos o conteúdo repassado e como as pessoas estavam recebendo. Isto para que elas aproveitem ao máximo e nós verifiquemos a apropriação do conteúdo pelas meninas, a multiplicação e a reação do público”, explicou a educadora social Suzana Santos, da Etapas.

Adolescentes elogiam encontro com feministas

Uma das participantes do projeto, a adolescente Yasmin, 15 anos, do Ibura, ficou feliz por poder passar adiante o que aprendeu sobre direitos e cidadania no Meninas em Movimento. Segundo ela, a conversa com outras mulheres que participaram da marcha foi uma ferramenta para ajudar quem está passando por uma situação de abuso ou violência sexual e não sabe como se proteger.

“Está sendo muito legal participar de uma campanha que não tem só eu, mas várias mulheres falando sobre a mesma coisa e que estão me apoiando e eu de alguma forma estou apoiando também”, relatou. Deborah, 14 anos, do mesmo território que Yasmin, estava na mesma sintonia. “Gostei porque consegui aprender mais, foi muito bom ouvir diferentes mulheres feministas sobre a realidade e a visão da função delas”, complementou.

Para a educadora social Anabelly Brederodes, da CMN, em Passarinho, foi muito gratificante poder proporcionar às meninas a primeira marcha de 8 de Março delas. “Elas ficaram bem abismadas com aquela diversidade de pessoas e de pautas políticas”. Entre as pautas que chamaram a atenção delas estavam, principalmente, as relacionadas ao corpo das mulheres, aos direitos sexuais e reprodutivos, à variedade de movimentos de mulheres e jovens negras e periféricas no centro, às mulheres no campo e às que lutam por moradia.

“Foi muito bonito elas dialogarem com outras parceiras de outras comunidades, e também a gente ampliar o nosso diálogo também para uma vida mais justa e acolhedora para meninos e meninas dentro das periferias. A partir da campanha foi possível alguns coletivos desejarem dialogar conosco e fazer intercâmbio entre jovens de bairros diferentes da Região Metropolitana do Recife. A gente já fez algumas articulações com os bairros de Joana Bezerra, Santo Amaro e Peixinhos, por exemplo”, exemplificou Anabelly.

Jovem mãe leva filho de 4 anos à marcha

Suzanna Mycaelly, 18 anos, esteve presente na caminhada representando o projeto e as meninas negras de Passarinho. Além de levar o propósito da campanha para outras pessoas e trocar experiência com outros projetos durante a manifestação, ela mostrou que marcha feminista também é lugar de mãe e de meninos:

“Trouxe meu filho de 4 anos para ele já ir aprendendo desde pequeno a não ser homem machista e saber que lugar de mulher é onde ela quiser”, comentou.

Uma das mulheres abordadas pelas meninas foi a advogada Valdete Lima, de 52 anos, que trabalha com o Coletivo de Mulheres em Jaboatão dos Guararapes. Para ela, a ação do Meninas em Movimento é fundamental em um país com números exorbitantes de assédio, violência sexual, feminicídio e transfeminicídio.

“É muito importante esse apropriar-se do nosso corpo, das nossas regras, e que as adolescentes entendam isso e percebam que elas podem fazer tudo o que elas quiserem, que não têm que seguir os ditames dessa sociedade ainda escravocrata, machista, sexista, que acha que lugar de mulher é na cozinha”, disse ela, parabenizando o trabalho.

Palestras em escola do Cabo de Santo Agostinho

No Cabo do Santo Agostinho, o Meninas em Movimento esteve presente não apenas nas ruas, mas também em ambiente escolar. A primeira ação foi uma atividade de multiplicação na Escola Técnica Estadual Luiz Alves Lacerda, onde houve duas palestras sobre o 8M e a divulgação da campanha “Todas Juntas Vencem” no laboratório e no auditório. Depois, as meninas foram para a concentração da caminhada, em frente ao Centro das Mulheres do Cabo, de onde partiram em marcha até a Praça da Estação, no Centro. Durante todo o percurso, as meninas tiveram a oportunidade de dialogar com a população e entregar panfletos da campanha falando sobre como evitar abusos.

As adolescentes estavam acompanhadas por mães, cuidadoras do ciclo de formação, mulheres das rodas de diálogo e ações de práticas integrativas e lideranças comunitárias, que são parceiras do projeto.

“O momento mais importante foi ver mulheres e meninas reunidas por um só propósito e aprender com elas a luta de cada uma. Também me tocou muito conhecer a história de uma mulher trans negra lutando pela comunidade LGBTQIA+”, contou Gabryelle, de Gaibu, feliz pelos direitos já garantidos e que estão a caminho de serem conquistados.

Saiba mais sobre o projeto Meninas em Movimento: www.actionaid.org.br/meninasemmovimento

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Por Agência Brasil

Alana Gandra – Repórter da Agência Brasil

A diretora de Direitos Humanos da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 1ª Região (Amatra1), Daniela Muller, disse que no Dia Internacional da Mulher, comemorado em 8 de março, os avanços registrados para a categoria no mercado de trabalho ainda não são suficientes para assegurar melhores ganhos.

Segundo a juíza, persiste a desigualdade de gênero no mercado de trabalho do Brasil. Hoje em dia, para que o profissional avance na carreira é exigida cada vez maior disponibilidade para o cargo e, muitas vezes, as mulheres não conseguem sequer concorrer ao posto pretendido, nem podem aceitá-lo pelas limitações que têm fora do ambiente de trabalho. Muitos empregadores também não colocam mulheres em alguns postos já com esse pensamento, lamentou. Essa divisão fora do ambiente de trabalho, que é muito desigual, pesa porque as empresas acabam privilegiando o homem, “até porque, se o homem tiver filhos, é a mulher que vai cuidar e ele fica disponível para os cargos de chefia”.

Daniela criticou o que, na prática, ocorre com as mulheres que engravidam e trabalham, uma vez que a gravidez ainda é considerada por muitas pessoas ou empresas uma limitação. “Só vai mudar quando a sociedade entender que isso é uma questão de todos. Cada novo cidadão interessa a todos nós. Enquanto isso for visto como um problema só da mulher, haverá essa dificuldade. A situação precisa ser melhor compreendida e acomodada”.

Licença-maternidade

A juíza defendeu o estabelecimento de uma licença-maternidade maior, mas que seja dividida entre o casal, porque isso diminuiria a pressão e a impossibilidade de a mulher crescer no emprego. Atualmente, o tempo de licença-maternidade é obrigatoriamente de 120 dias, ou quatro meses. No momento, somente empregadores que fazem parte do Programa Empresa Cidadã podem estender o período para 180 dias, ou seis meses.

O Projeto de Lei 151/2017, da senadora Rose de Freitas (MDB-ES), dá à mulher gestante 180 dias de licença-maternidade, podendo compartilhar até 60 dias do período com seu cônjuge ou companheiro, possibilitando que o próprio casal decida quem vai cuidar do filho durante a licença. “A licença passa a ser do casal. Isso igualaria um pouco a condição no mercado de trabalho”, disse Daniela Muller.

Ela acrescentou que o mercado de trabalho ainda é injusto para a mulher, apesar de a Constituição assegurar que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. “Não basta só o processo jurídico, tem que ser política pública”. Para a juíza, a desigualdade continua de forma evidente.

Entre os avanços registrados, ela lembrou que as mulheres se estabeleceram no mercado de trabalho. “A gente não vive mais a situação de que a mulher trabalha só para complementar a renda do marido. Nisso, avançamos”.

Salários

“As pesquisas comprovam que a mulher ainda tem dificuldade de ter acesso a cargos de maior hierarquia e que os salários são menores”. Isso ocorre, segundo a juíza, por todas as atribuições que acabam ficando com a mulher na família, o que reflete muito na carreira, fora o próprio preconceito em algumas atividades. “Essa divisão injusta das atividades domésticas, creio que é o maior empecilho ao mercado de trabalho”.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), relativos ao quarto trimestre do ano passado, mostram que apesar de a maioria da população em idade de trabalhar ser formada por mulheres (52,4%), a maior parte das pessoas ocupadas é de homens (56,3%). Além disso, as mulheres são maioria (54,2%) entre os trabalhadores subutilizados, sub-ocupados e trabalhadores em potencial, como mulheres que desistiram de trabalhar para cuidar dos filhos.

Em relação aos baixos salários, a juíza argumentou que esse fato está relacionado a outra questão, que é o elevado número de brasileiros que têm na mãe o único responsável. “Isso acaba levando a mulher a se sujeitar a piores formas de trabalho, com remuneração pior também. Acredito que uma coisa está relacionada a outra”. De acordo com o IBGE, as mulheres ainda recebem, em média, no Brasil, 22,9% a menos que os homens.

A mesma razão faz com que a mulher acabe tolerando um nível de desrespeito no ambiente de trabalho maior do que o homem, pela responsabilidade de ser a única provedora para seus dependentes. “E acaba se sujeitando. Fatores históricos e culturais também contribuem para que isso ocorra. A juíza do trabalho observou que, muitas vezes, ocorre que mulheres em posição hierárquica superior reproduzem essa situação quando têm subordinados do mesmo sexo. “A gente está muito condicionada a dizer que está tudo bem, a não ser agressiva. Essas questões culturais se repetem e a mulher, muitas vezes, se cala”.

O assédio sexual passa também por essa visão sobre a mulher, que está ali para servir ao homem, afirmou Daniela Muller. Ela lembrou que a primeira greve geral no Brasil, em 1917, foi iniciada por tecelãs de São Paulo, que denunciavam abusos sofridos das pessoas encarregadas. “O assédio é uma das questões mais antigas da pauta das trabalhadoras brasileiras”.

Edição: Graça Adjuto