Dezenas de jovens participantes do projeto Meninas em Movimento ocuparam ruas da Região Metropolitana do Recife durante os atos do 8 de março pelo Dia Internacional da Mulher. As adolescentes de diferentes territórios se reuniram nas principais manifestações locais para divulgar a campanha “Todas Juntas Vencem”.

Texto: Aline Vieira Costa
Fotos: Ivan Melo

Dezenas de jovens participantes do projeto Meninas em Movimento ocuparam ruas da Região Metropolitana do Recife durante os atos do 8 de março pelo Dia Internacional da Mulher. No Recife e no Cabo de Santo Agostinho, adolescentes de diferentes territórios se reuniram nas principais manifestações locais para divulgar a campanha “Todas Juntas Vencem”, que busca empoderar meninas e mulheres para o enfrentamento à violência e à exploração sexual de crianças e adolescentes.

O projeto é uma realização da Actionaid em parceria com as organizações Casa da Mulher do Nordeste (CMN), Centro das Mulheres do Cabo (CMC) e Etapas, com patrocínio da Petrobras e do Governo Federal por meio do Programa Petrobras Socioambiental.

No Recife, as meninas dos territórios do Ibura e Passarinho participaram da marcha que partiu do Parque Treze de Maio, no Centro, e se dirigiu ao Palácio do Campo das Princesas, sede do governo estadual, com o objetivo de levar reivindicações de mulheres pernambucanas em um documento chamado “Manifesto Feminista 8M”.

O foco de atuação das meninas do Ibura junto com a Etapas foi na concentração do público no parque. Lá, as elas confeccionaram cartazes, se dividiram em pequenos grupos e fizeram as atividades de multiplicação da campanha, divulgando informações sobre prevenção e meios de fazer denúncias.

“Elas também fizeram registros em foto e vídeo para compartilharmos internamente a experiência da abordagem, entendermos o conteúdo repassado e como as pessoas estavam recebendo. Isto para que elas aproveitem ao máximo e nós verifiquemos a apropriação do conteúdo pelas meninas, a multiplicação e a reação do público”, explicou a educadora social Suzana Santos, da Etapas.

Adolescentes elogiam encontro com feministas

Uma das participantes do projeto, a adolescente Yasmin, 15 anos, do Ibura, ficou feliz por poder passar adiante o que aprendeu sobre direitos e cidadania no Meninas em Movimento. Segundo ela, a conversa com outras mulheres que participaram da marcha foi uma ferramenta para ajudar quem está passando por uma situação de abuso ou violência sexual e não sabe como se proteger.

“Está sendo muito legal participar de uma campanha que não tem só eu, mas várias mulheres falando sobre a mesma coisa e que estão me apoiando e eu de alguma forma estou apoiando também”, relatou. Deborah, 14 anos, do mesmo território que Yasmin, estava na mesma sintonia. “Gostei porque consegui aprender mais, foi muito bom ouvir diferentes mulheres feministas sobre a realidade e a visão da função delas”, complementou.

Para a educadora social Anabelly Brederodes, da CMN, em Passarinho, foi muito gratificante poder proporcionar às meninas a primeira marcha de 8 de Março delas. “Elas ficaram bem abismadas com aquela diversidade de pessoas e de pautas políticas”. Entre as pautas que chamaram a atenção delas estavam, principalmente, as relacionadas ao corpo das mulheres, aos direitos sexuais e reprodutivos, à variedade de movimentos de mulheres e jovens negras e periféricas no centro, às mulheres no campo e às que lutam por moradia.

“Foi muito bonito elas dialogarem com outras parceiras de outras comunidades, e também a gente ampliar o nosso diálogo também para uma vida mais justa e acolhedora para meninos e meninas dentro das periferias. A partir da campanha foi possível alguns coletivos desejarem dialogar conosco e fazer intercâmbio entre jovens de bairros diferentes da Região Metropolitana do Recife. A gente já fez algumas articulações com os bairros de Joana Bezerra, Santo Amaro e Peixinhos, por exemplo”, exemplificou Anabelly.

Jovem mãe leva filho de 4 anos à marcha

Suzanna Mycaelly, 18 anos, esteve presente na caminhada representando o projeto e as meninas negras de Passarinho. Além de levar o propósito da campanha para outras pessoas e trocar experiência com outros projetos durante a manifestação, ela mostrou que marcha feminista também é lugar de mãe e de meninos:

“Trouxe meu filho de 4 anos para ele já ir aprendendo desde pequeno a não ser homem machista e saber que lugar de mulher é onde ela quiser”, comentou.

Uma das mulheres abordadas pelas meninas foi a advogada Valdete Lima, de 52 anos, que trabalha com o Coletivo de Mulheres em Jaboatão dos Guararapes. Para ela, a ação do Meninas em Movimento é fundamental em um país com números exorbitantes de assédio, violência sexual, feminicídio e transfeminicídio.

“É muito importante esse apropriar-se do nosso corpo, das nossas regras, e que as adolescentes entendam isso e percebam que elas podem fazer tudo o que elas quiserem, que não têm que seguir os ditames dessa sociedade ainda escravocrata, machista, sexista, que acha que lugar de mulher é na cozinha”, disse ela, parabenizando o trabalho.

Palestras em escola do Cabo de Santo Agostinho

No Cabo do Santo Agostinho, o Meninas em Movimento esteve presente não apenas nas ruas, mas também em ambiente escolar. A primeira ação foi uma atividade de multiplicação na Escola Técnica Estadual Luiz Alves Lacerda, onde houve duas palestras sobre o 8M e a divulgação da campanha “Todas Juntas Vencem” no laboratório e no auditório. Depois, as meninas foram para a concentração da caminhada, em frente ao Centro das Mulheres do Cabo, de onde partiram em marcha até a Praça da Estação, no Centro. Durante todo o percurso, as meninas tiveram a oportunidade de dialogar com a população e entregar panfletos da campanha falando sobre como evitar abusos.

As adolescentes estavam acompanhadas por mães, cuidadoras do ciclo de formação, mulheres das rodas de diálogo e ações de práticas integrativas e lideranças comunitárias, que são parceiras do projeto.

“O momento mais importante foi ver mulheres e meninas reunidas por um só propósito e aprender com elas a luta de cada uma. Também me tocou muito conhecer a história de uma mulher trans negra lutando pela comunidade LGBTQIA+”, contou Gabryelle, de Gaibu, feliz pelos direitos já garantidos e que estão a caminho de serem conquistados.

Saiba mais sobre o projeto Meninas em Movimento: www.actionaid.org.br/meninasemmovimento

Confira a Galeria de Fotos:

O evento marca o encerramento das ações da ONG em 2022. Entre os serviços estão orientação jurídica, atendimento psicológico, apresentações culturais e vacinação contra Covid-19 e Influenza

Afim de fortalecer a luta por direitos e marcar o encerramento das ações da Etapas em 2022, a Etapas promove sua Culminância Por Direitos, no próximo sábado (17/12), das 9h às 17h, na Escola Municipal Maria Sampaio de Lucena (UR-1), oferecendo serviços gratuitos para população.

O evento terá início às 9h com uma Roda de Diálogo Para Detentores de Deveres: uma conversa sobre atualizações, desafios e conjuntura das políticas públicas para crianças e adolescentes em Pernambuco com gestores públicos da saúde, educação e assistência social atuantes no Ibura.

A parte da manhã será facilitada pelo historiador e especialista em políticas públicas para crianças e adolescentes, Fernando Silva. Esta atividade faz parte do projeto “Nenhum Direitos a Menos, mas Todos os Direitos” (Etapas/KNH Alemanha) que tem o objetivo de fomentar e fortalecer uma Rede de Proteção para crianças e adolescentes no território do Ibura.

A partir das 13h, o evento é aberto ao público. Serão mais de 10 atividades simultâneas acontecendo na Escola Maria Sampaio. A oficina de percussão, o atendimento psicológico, a orientação jurídica e escovação dentária acontecerão nas salas de aula, enquanto a animação teatral, a recreação, a feira de artesanato, a distribuição de kits de higiene bucal e a vacinação contra covid-19 e influenza acontecerão no pátio.

O evento contará com apresentações culturais de artistas locais: Grupo de Dança Passistas Pequenas Estrelas de Três Carneiros e o Boi de Mainha do Jordão.

Confira a Programação:

Manhã (9h às 12h)

Roda de Diálogo Para Detentores de Deveres
Conversa com Fernando Silva (Historiador e Especialista em Políticas Públicas para Crianças e Adolescentes)

Tarde (13h às 17h)

– Oficina de Percussão
– Recreação
– Escovação Dentária
– Distribuição de Kits de Higiene Bucal
– Atendimento Psicológico
– Orientação Jurídica
– Feira de Artesanato

Apresentações Culturais (A partir das 17h)

– Grupo de Dança Passistas Pequenas Estrelas
– Grupo de Teatro/ Animação Cultural
– Boi de Mainha

Vacinação contra Covid-19 e Influenza (Obrigatório levar o cartão de vacinação)

Texto: Aline Vieira Costa
Fotos: Ivan Melo

Como fazer com que a violência não chegue a crianças e adolescentes? O que fazer para
que elas tenham mais recursos e para que possamos melhor lidar com o que já ocorre?
Que alternativas podemos pensar em termos preventivos? Essas são apenas algumas das
perguntas a serem debatidas pelos integrantes dos comitês que estão sendo formados nos
territórios contemplados pelo projeto Meninas em Movimento, realizado pela ActionAid em
parceria com as organizações Casa da Mulher do Nordeste (CMN), Centro das Mulheres do
Cabo (CMC) e Etapas, com patrocínio da Petrobras e do Governo Federal, por meio do
Programa Petrobras Socioambiental.

Os comitês estão previstos na governança do projeto e têm como objetivo discutir
problemas e soluções locais. Eles são também cruciais para o fortalecimento da rede de
proteção a crianças e adolescentes contra situações de abuso e violência sexual. Quatro
comitês estão em construção: um no Ibura, no Recife; um em Passarinho, também na
capital pernambucana; um no Cabo de Santo Agostinho, que abrange os quatro territórios
do município que fazem parte do projeto — Gaibu, Engenho Massangana, Nova Vila
Claudete e Vila Suape; e um em Vila Califórnia, Ipojuca. Cada comitê terá encontros
bimestrais, durante um ano e meio, e é formado por representantes das comunidades, do
poder público e das redes locais de enfrentamento à violência. As conversas são
desenvolvidas de modo que todos possam interagir, expor as realidades e propor soluções
em conjunto.

A ideia é aquecer o ecossistema de práticas de prevenção, de acordo com a especialista
em Monitoramento e Projetos da ActionAid, Tricia Calmon, que coordena o projeto. Mas
para o sucesso de uma rede que protege crianças e adolescentes é crucial que se tenha
uma aproximação com a realidade dos territórios.

“Sabemos que é um tema muito sensível. Os profissionais do campo precisam dialogar
sobre o assunto, envolver a comunidade e as famílias, para que os comitês sejam espaços
de conversa sobre a temática”, explica Tricia.

A especialista comenta que a rede atual de cada território nem sempre tem a capacidade de
acompanhar e viabilizar soluções para o problema da violência. Por isso o desejo de se
pensar em alternativas mais responsivas e de promover essa mobilização através do
comitê, que conta com a participação de representantes de equipamentos públicos e da
sociedade civil — desde lideranças, associações de bairro, conselho tutelar até a rede
informal e todos os interessados em atuarem em seus territórios.

“A gente espera colaborar para fomentar uma rede de proteção organizada, mas o desafio é
muito grande, e precisamos pensar em uma série de saídas diversificadas. O importante é
tirar o assunto do silêncio, pois isso não ajuda a diminuir o número de casos”, avalia Tricia.

O projeto se dispõe a trabalhar pela garantia de direitos conquistados em um árduo
processo histórico no Brasil, como enfatiza a assistente social Itanacy Oliveira, que é
diretora do Programa Mulher Trabalho e Vida Urbana da Casa da Mulher do Nordeste, que
atua em Passarinho. É um convite a afirmar essas conquistas e fortalecer o exercício delas.
No território de Passarinho, as atividades iniciaram-se em fevereiro, com a formação do
grupo.

“O primeiro encontro foi um marco, no qual fizemos a divulgação da iniciativa para o coletivo
que nos acompanha, o Grupo Espaço Mulher. Mostramos o que é o projeto, os benefícios
dele, mas, principalmente, a importância do trabalho com a juventude e do cuidado com as
mulheres”, conta Itanacy.

A diarista Evandra Dantas da Silva, uma das fundadoras do Grupo Espaço Mulher,
existente há 22 anos, tem a expectativa de que o comitê corra atrás de soluções para o
território, principalmente no que diz respeito à educação.

“Muitas crianças aqui vão estudar fora da comunidade, por não haver escolas suficientes. E
não há área de lazer. Meninos pedem o que fazer, e meninas que vimos pequeninas, agora
vemos grávidas”, relata.

Falta de segurança é outro problema recorrente, segundo a líder comunitária do
Habitacional Miguel Arraes, Nathália Viana.

“Quero que esse comitê aconteça e que pessoas de fora estejam mais presentes aqui
dentro, participem com a gente, apoiem, cobrem”, assinalou Nathália, que é mulher trans e
trabalha como cuidadora de idosos.

Para Itanacy, o comitê é um espaço de diálogo importante para a garantia de um processo
democrático de gestão e também para acompanhar a atuação do projeto Meninas em
Movimento. Será essencial para conduzir os ajustes, apontar melhorias e estimular a
participação da comunidade. “É uma escuta para além das organizações e da própria
ActionAid, que é a executora do projeto, e isso abre um espaço de diálogo democrático, que
é o que a gente mais precisa hoje no Brasil”, examina.

Saiba mais sobre projeto Meninas em Movimento:
www.actionaid.org.br/meninasemmovimento

“Meninas em Movimento” visa a defender os direitos de crianças e adolescentes,
promovendo equidade de gênero e igualdade étnico-racial, impactando mais de 16 mil
pessoas no Recife e no litoral sul de Pernambuco. Iniciativa faz parte do Programa Petrobras
Socioambiental e atuará em sete territórios da região ao longo de dois anos.

Meninas, adolescentes e jovens empoderadas podem ser agentes de combate à violência sexual contra mulheres. Este princípio norteia o “Meninas em Movimento”, novo projeto da ActionAid em parceria com as organizações pernambucanas Casa da Mulher do Nordeste (CMN), Centro de Mulheres do Cabo (CMC) e Etapas. Com patrocínio da Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental, a iniciativa visa a defender os direitos de crianças e adolescentes, promovendo equidade de gênero e igualdade étnico-racial no Recife e no litoral sul de Pernambuco, impactando mais de 16 mil pessoas na região. “Meninas em Movimento” está diretamente relacionado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) da Agenda 2030 das Nações Unidas, especialmente os ODSs 4 (educação de qualidade) e 5 (igualdade de gênero).

O projeto será lançado oficialmente no próximo dia 27 de outubro, quarta-feira, às 16h, em um webinar aberto ao público, com transmissão pelo YouTube da ActionAid (www.youtube.com/ActionAidnoBrasil). Com falas da Petrobras, da ActionAid e das organizações parceiras envolvidas no projeto, o evento online apresentará o “Meninas em Movimento” e sua importância para as comunidades no contexto da pandemia, além de contar com uma conferência de abertura com Caroline Arcari, escritora e especialista em Educação Sexual, que falará sobre estratégias de enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes.

Os temas do projeto serão trabalhados principalmente com crianças, adolescentes e mulheres para promover a autonomia e incentivar a autoproteção. Ao longo de 24 meses, serão realizados cursos, oficinas, campanhas educativas e eventos de multiplicação de saberes em sete territórios de três municípios pernambucanos: Ibura e Passarinho, no Recife; Vila Califórnia, em Ipojuca, e Engenho Massangana, Gaibu, Vila Suape e Vila Nova Claudete, no Cabo de São Agostinho.

O “Meninas em Movimento” beneficiará 830 pessoas diretamente, sendo 80 crianças de até 6 anos e 270 entre 6 e 11 anos, envolvendo meninos e meninas que participarão do ciclo de formação visando à prevenção da violência sexual; 105 meninas de 12 a 14 anos, que, além de participarem do ciclo de formação de prevenção à violência sexual, farão parte de ações de comunicação para multiplicar as informações; 105 adolescentes de 15 a 17 anos e 100 jovens de 18 a 29 anos, que farão cursos de digital influencer para pautar a prevenção à violência sexual nas redes socais, e 170 mulheres adultas, que participarão de rodas de diálogo.

O projeto vai alcançar um público indireto de 16.045 pessoas nos sete territórios participantes, e a estimativa é que 70% do público envolvido sejam de pessoas negras. As estatísticas mostram que a população de mulheres pobres e negras está mais exposta a situações de vulnerabilidade social e violência sexual.

Violência se agravou na pandemia

As parceiras neste projeto são organizações que já desenvolvem ações de prevenção à violência sexual em seus locais de atuação e com as quais a ActionAid trabalha há mais de dez anos. Para Ana Paula Brandão, diretora Programática da ActionAid, o “Meninas em Movimento” combate um problema que vem se agravando:

“Meninas em Movimento foi idealizado há dois anos, e por causa da pandemia só vamos botar em prática agora. É duro saber que dois anos depois o projeto ficou ainda mais relevante, porque percebemos que a violência contra crianças e adolescentes tem se tornado mais aguda. O Brasil tem números severos de violência, inclusive sexual. A pobreza e a desigualdade ampliaram o problema. Por outro lado, temos uma rede de direitos consolidada no país. Infelizmente, nos últimos anos, talvez tenha havido um desabastecimento dessa rede.”

Ana Paula destaca também o trabalho consistente feito há décadas pelas três organizações pernambucanas:

“Temos absoluta confiança na parceria e na força de trabalho das nossas parceiras. “Meninas em Movimento” vem em uma hora especial, de muita demanda. As situações de saúde mental e física exigem investimentos. O patrocínio da Petrobras chega em um momento em que há necessidade de ampliar a ação. O projeto vai se somar a outras ações consistentes, e uma organização como a ActionAid traz visibilidade para o tema da violência.”  

Organizações atuam há décadas na região

A ideia de integrar as ações do “Meninas em Movimentos” ao Programa Petrobras Socioambiental, que tem como eixo de atuação a prevenção e o enfrentamento à violência sexual de crianças e adolescentes na região assistida pelo projeto, surgiu justamente a partir das relações consolidadas das organizações com as sete comunidades, sendo que cinco dessas, no litoral sul de Pernambuco, estão na área de abrangência da Petrobras e localizadas no entorno da Refinaria Abreu e Lima (RNEST).

A organização feminista Centro de Mulheres do Cabo (CMC) atua no Cabo de São Agostinho há mais de três décadas e se destaca pela defesa dos direitos humanos das mulheres e do enfrentamento à violência de gênero. Para Nivete Azevedo, coordenadora-geral do CMC, projetos como o “Meninas em Movimento” são fundamentais:

“Mulheres, adolescentes e crianças passaram por muita violência sexual no Cabo. Temos uma geração de crianças nascidas de meninas e que vivem sem a presença do pai. Os danos são irreversíveis. Mas se não é possível reparar o abuso sofrido, ao menos podemos prevenir, e garantir os direitos daqui para frente. A pandemia agravou os problemas que já existiam, inclusive pela perda de renda. As mulheres tradicionalmente pescam na região e ficaram meses paradas. Isso agravou muito o quadro de fome. A violência doméstica aumentou. Há uma ausência de políticas públicas. O turismo é desordenado e traz violência sexual e tráfico, inclusive de pessoas. O investimento na região é importante para contribuir com as ações das organizações sociais. A sociedade civil organizada tem papel preponderante para a reparação de direitos e o fortalecimento das redes de serviço e dos vínculos, da identidade.”

Já a ONG feminista Casa da Mulher do Nordeste (CMN), com mais de 40 anos de história, está desde 2009 na comunidade de Passarinho, no Recife, com o programa Mulher, Trabalho e Vida Urbana, uma parceria com a ActionAid. No “Meninas em Movimento”, o trabalho será no mesmo território e com ênfase no universo digital, como explica Itanacy de Oliveira, diretora de Programas da CMN:

“A construção coletiva é uma marca muito forte de ‘Meninas em Movimento’. Vamos pensar sobre as questões identitária, dos direitos humanos, e do direito à cidade em um lugar urbano tão disputado como o Recife; o direito à vida, o direito de existir, de ter acesso a serviços públicos de qualidade, de ser ouvido pelo Estado. O direito à cidade é o pano de fundo. Vamos trabalhar com meninas e adolescentes de 12 a 17 anos e, também, com as suas famílias. Como mulheres, jovens e crianças aparecem nas mídias? Quais as oportunidades no mundo digital, que é o mundo de hoje? Nossa metodologia é participativa. O projeto será online e presencial, mas queremos nos concentrar no presencial, escutar as mulheres”, destaca.

A ONG Etapas (Equipe Técnica de Assessoria, Pesquisa e Ação Social), começou a perceber um aumento da violência em geral no Ibura, seu território de atuação há mais de três décadas. Líderes comunitários levaram a Etapas a ideia de fazer um trabalho para meninas e adolescentes, como conta Isabela Valença, uma das duas coordenadoras da organização:

“As adolescentes sofrem um estigma quando dizem que são do Ibura. O preconceito aparece na escola, no trabalho e até nos relacionamentos afetivos. Mas o Ibura tem coisas boas, como tradição cultural forte e lideranças comunitárias combativas. O projeto Meninas em Movimento vem fortalecer uma atuação antiga da Etapas de prevenir e enfrentar o abuso e a exploração sexual de meninas. O projeto oferece oportunidades de arte e cultura que atraem esse público. Ações de multiplicação de conhecimento possibilitam que o problema apareça sem vitimar a menina, criam um ambiente favorável para tratar a questão. E o projeto não atende só as meninas. Sabemos que o abuso muitas vezes acontece em casa. Será importante trabalhar com a família. Não adianta empoderar, e a menina chegar em casa e ser abafada.”

Isabela ressalta que as organizações envolvidas têm expertises diferentes. O projeto permitirá a troca de metodologia entre as instituições parceiras, fortalecendo o programa, que no Ibura agregará meninas, famílias, lideranças comunitárias, comerciantes locais, gestores de escolas públicas, todos como parte de uma rede de proteção:

“Vamos oferecer soluções para as meninas. Faremos uma pesquisa nos sete territórios assistidos pelo projeto para saber qual a situação atual delas em relação a vida econômica e social, ao abuso e à exploração. Isso vai enriquecer o detalhamento e o monitoramento das atividades. Teremos ações que vão realmente responder aos problemas e às dificuldades identificadas. Ao final do projeto será possível avaliar os avanços e os impactos.”

Os projetos “Mudando Prática e Assegurando Direitos” – MPAD (Etapas/Comdica) e “Mais Proteção, Menos Violência” (Etapas/KNH-Alemanha) – ambos executados em comunidades do Ibura – completam três anos de atividades construindo novas práticas de diálogo e participação, envolvendo crianças, lideranças comunitárias, gestores públicos, familiares e responsáveis no enfrentamento à violência doméstica e comunitária contra crianças e adolescentes do território.

Mudando Práticas, Assegurando Direitos

Parte da turma de 20 crianças do terceiro ano do MPAD em atividade no Posto de Saúde da Família de Três Carneiros

Com a missão de fortalecer a afetividade entre crianças, familiares e comunidade, e estimular a reflexão com temas sociais que fazem parte do cotidiano, o Mudando Práticas, Assegurando Direitos, vem criando autonomia e consciência nas crianças com relação aos direitos, apoiando famílias para que estejam mais abertas para o diálogo e observando, junto ao poder público, as ações e lacunas que contribuem para a insegurança e possíveis violações de direitos das crianças e adolescentes.

“Um espaço histórico de acumulação de lixo que deixava uma rua mais escura, perigosa e suja, rua que as crianças utilizam diariamente para se locomover para escola, está sendo recuperado a partir da articulação do projeto com a Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana – EMLURB e outros órgãos públicos”, exemplifica o pedagogo e coordenador do MPAD, Pedro Ribeiro.

“A comunidade de Três Carneiros está mais aberta a falar sobre violência sexual, tendo se tornado um tema que vem sendo tratado constantemente pelas famílias, que hoje conseguem identificar que seus filhos e filhas estão por muitos momentos em situação de vulnerabilidade. A alternativa de criar autonomia e consciência com relação aos seus direitos, em crianças e adolescentes, para que não se tornem presa fácil para violadores/abusadores, é vista pelas famílias de forma positiva”, relata Pedro.

Mais proteção, Menos violência

O projeto tem o objetivo de enfrentar a violência doméstica através do fortalecimento dos vínculos familiares, para que crianças e adolescentes experimentem relações humanizadas em um ambiente familiar e comunitário favorável. O trabalho direto acontece com 240 crianças e adolescente de 6 a 17 anos, e com 120 famílias das comunidades de Vila 27 de Abril e Portelinha.

Para o educador do Mais Proteção, Menos Violência, Cristiano Ferreira, os avanços com o terceiro ano do projeto são perceptíveis através de observações do progresso das crianças e adolescentes sobre o conhecimento dos direitos e deveres, na multiplicação dos conhecimentos adquiridos, assim como o cuidado entre os pares.

“Nos grupos de adolescentes percebe-se uma maior participação nos espaços de incidência, assim como a apropriação pelas questões que permeiam a sociedade.
O brincar hoje é um momento de troca e afeto e não mais de violência e individualismo, os discursos dos adolescentes homens já não são mais machistas e há uma igualdade entre os gêneros nas suas relações interpessoais”, reflete Cristiano.

Para a assistente social, Isabela Valença, o trabalho com as famílias está avançando na perspectiva do conhecimento de mães, pais e responsáveis com novas formas de educar através do diálogo. “Algumas famílias identificaram que educavam com violência. A partir das novas práticas que foram trabalhadas no projeto, alguma reafirmaram o desejo de mudar”, aponta.

A Rede De Proteção formada por Detentores de Deveres (famílias, organizações comunitárias e gestores públicos) – avança no que se refere aos encontros semestrais nos cursos promovidos pela Etapas.

Como estratégia de buscar a participação efetiva de crianças e adolescentes na direção de uma plena realização do direito a se expressar livremente, passando pelo direito a proteção e ainda o direito a proatividade na construção dos conteúdos do projeto “Mais Proteção, Menos Violência” (Etapas/KNH) – cerca de 140 crianças e adolescentes de comunidades do Ibura tiveram a oportunidade de desenhar suas impressões sobre a cultura do enfrentamento à violência doméstica e comunitária e vê-las estampando as paredes do Conselho de Moradores da Vila 27 de Abril – lugar onde acontece o projeto – através da Ação de Grafitagem facilitada pela ONG Cores do Amanhã.

Segundo o educador do “Mais Proteção, Menos Violência”, Cristiano Ferreira, a ideia de escolher a Oficina de Grafite se deu pelo fato do método de expressão ir de encontro com a realidade das periferias.

“O grafite nasce no subúrbio e passa uma mensagem de protesto. Nosso foco foi desenhar os temas discutidos no projeto e contar um pouco da história das domésticas que construíram a comunidade, falar do feminismo, fazer refletir sobre a padronização do corpo e abordar a consciência negra”, afirma o educador.

A metodologia da Ação de Grafitagem trazida pelo Cores do Amanhã na pessoa de Rudson (ex aluno do projeto do Cores no bairro de Tejipió – Recife) e acordada entre os participantes foi a abordagem do nascimento do Movimento Hip Hop de maneira lúdica para as crianças e documental para os adolescentes. Foi discutida a diferença entre o grafitte e a pichação, procurando desmistificar os estereótipos de marginalização que permeiam a arte do grafitte e as mensagens de protesto na pichação. As crianças de 6 a 11 anos criaram pinturas em tela e moldes vazados usados no grafitte, e os adolescentes (12 a 17 anos ) realizaram intervenções nas paredes externas do Conselho de Moradores.

Após duas semanas de atividades, a Ação de Grafitagem foi finalizada com um mutirão de artistas grafiteiros e participação do grupo de percussão do Cores do Amanhã.

Os desenhos das crianças e adolescentes foram utilizados para produção de um calendário 2018 para ser entregue às famílias participantes da Gincana do Afeto.