O cenário desafiador resultante do golpe político-midiático, impetrado contra a Presidente do Brasil eleita que configurou uma ruptura democrática e trouxe com isso crise política, retrocesso de direitos e ampliação de uma onda conservadora sem precedentes, foi tema do seminário promovido pela Etapas, dia 23/5, que reuniu cerca de 150 pessoas na discussão sobre “O Futuro da Democracia”. O evento – que faz parte das comemorações dos 35 anos de fundação e resistência da atuação da Etapas no Recife e Região Metropolitana – debateu sobre os desafios e as estratégicas para articular o fortalecimento da participação popular e a democratização dos meios de comunicação.

A mesa de abertura que deu início ao seminário trouxe depoimentos e homenagens dos representantes das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) parceiras na luta pelos direitos humanos com a Etapas. Estavam presentes as OSC’s Kinder Not Hilfer-Brasil, ActionAid-Brasil, Fórum de Direitos das Crianças e Adolescentes de Pernambuco (Fórum DCA), Fórum das Juventudes de Pernambuco (FOJUPE), Associação Brasileira de ONGs, PREZEIS, Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam), Articulação Recife de Luta, e Federação de Moradores do Ibura-Jordão (FIJ).

Em seguida a mesa de debates formada pelo Diretor e Editor-chefe do Le Monde Diplomatique – Silvio Caccia Bava – e pela Professora e Doutora em Comunicação – Nataly Queiroz, facilitou reflexões sobre: a cronologia da monarquia à democracia, o papel do mercado no modelo de democracia, a polarização de extremos ideológicos na política, as experiências de lutas dos movimentos sociais internacionais, a comunicação como direito humano e processo político.

“A democracia surge para se opor aos reis e imperadores, para tirar o poder as oligarquias. Hoje, não são mais os governos que mandam, são os bancos. O governo aprofunda as desigualdades, onde os ricos ficam mais ricos e os pobres mais pobres. A dívida das empresas nos estados, municípios e federação é o mesmo valor que o PIB brasileiro (2 trilhões de reais). São 500 bilhões de reais de juros por ano que a gente paga da dívida pública com nossos impostos. A economia se afastou da democracia e o povo não tem mais os instrumentos da democracia para se defender”, explana Sílvio.

Para Nataly , “o mercado acaba se impondo como uma espécie de Deus”, o Estado acaba sendo agende do mercado e não agente do povo. “A democracia precisa se distanciar do capital, das relações de classes, do sistema patriarcal, do racismo e colonialismo”, comenta.

O Futuro da Democracia

Exemplos Internacionais

Silvio Caccia Bava trouxe os exemplos de movimentos socialistas de jovens nos Estados Unidos, Inglaterra, França que estão desobedecendo as regras para mudar a política. “Nos EUA, o movimento Our Revolution conseguiu organizar 600 grupos e disputar as políticas nos espaços público e está convocando a participação da sociedade para contribuição financeira de 5 doláres para quem acreditar na causa. Na Inglaterra, o Momentum. Na França, o Insubmissa. Esse é o ensinamento que a gente precisa pensar, porque são milhares de pessoas na luta por direitos que estão sem saber para onde ir”, comenta.

“A democracia é uma construção. Se nós vivemos uma transformação do mundo em que o poder dos bancos comprou a democracia, nós temos que começar a criar um movimento não só de resistência, mas de criar o controle do território local, de começar a exercer -nos municípios- uma influência crescente de poder”, acrescenta Silvio.

Direito à Informação

“Comunicação não é uma ferramenta. O instrumento é o rádio, a internet, a TV, o jornal. Mas a comunicação é um direito humano assegurado pela constituição cidadã. A realidade se forma por meio de processos de comunicação. A cultura vai ser partilhada por meios de processos de comunicação. As concessões públicas existem para fazer prevalecer o interesse público, o direito à informação, mas cinco famílias (Marinho, Abravanel, Macedo…) controlam os principais veículos de comunicação, controlam as informações e vão silenciar ou criminalizar as pautas dos movimentos sociais”, explana a professora Nataly.

A internet se popularizou e os cidadãos/movimentos sociais conseguiram dar visibilidade às suas pautas. Mas, segundo a professora, a internet se expandiu também impulsionada pelo mercado. “A exemplo do Facebook, que controla os nossos dados e nos confinam em bolhas”. “Se os jovens não acessarem rádio, TV, jornal, não vão saber sobre as disputas eleitorais, porque nas bolhas/redes de contatos que o Facebook nos coloca se dilui boa parte das discussões possíveis de serem feitas”, alerta.

Na ocasião houve o lançamento da Campanha Etapas 35 anos: Faça parte desta Cultura de Paz. Uma chamada para sustentabilidade da Instituição.

Assista:

Projeto “Mais proteção, Menos violência” mobiliza moradores da Vila 27 de Abril e Portelinha para refletir e combater a exploração sexual (Foto: Comunicação Etapas)

Com o objetivo de convocar a sociedade a participar da luta pela prevenção e combate à violência sexual contra crianças e adolescentes, na manhã de 18 de maio – Dia Nacional de Combate à Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes – meninos e meninas dos 6 aos 17 anos participantes dos projetos da Etapas no Ibura – dividiram-se em grupos e caminharam pela Vila 27 de Abril, Portelinha e Três Carneiros com entrega de panfletos e colagem de lambes nos espaços públicos das comunidades.

A iniciativa da Etapas conta com a parceria do Conselho de Moradores da Vila 27 de Abril, Associação de Moradores da Portelinha, Clube de Mães de Três Carneiros, Federação Ibura-Jordão (FIJ), PPM, ActionAid e KNH-Brasil.

As crianças e adolescentes dos projetos da Etapas também participaram do Ato no Recife organizado pela Rede de Enfrentamento à Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes de Pernambuco que saiu em caminhada do Parque 13 de Maio até a Praça do Carmo.

História:

No dia 18 de maio de 1973, uma menina de 8 anos foi sequestrada, violentada e cruelmente assassinada no Espirito Santo. Seu corpo apareceu seis dias depois carbonizado e os seus agressores, jovens de classe média alta, nunca foram punidos. A data ficou instituída como o “Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes” a partir da aprovação da Lei Federal nº. 9.970/2000. O “Caso Araceli”, como ficou conhecido, ocorreu há quase 40 anos, mas, infelizmente, situações absurdas como essa ainda se repetem.

Denúncia:

No Brasil o “Disque 100”, criado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, é um serviço de recebimento, encaminhamento e monitoramento de denúncias de violência contra crianças e adolescentes. Funciona diariamente de 8h às 22h, inclusive aos finais de semana e feriados. Endereço eletrônico: disquedenuncia@sedh.gov.br.

O cenário atual é bastante desafiador resultante do golpe político, midiático, impetrado contra a Presidente do Brasil eleita o que se configurou na ruptura democrática e trouxe  com isso crise política, retrocesso nos direitos duramente conquistados e ampliação de uma onda conservadora sem precedentes.

O que assiste no momento é o desmonte das garantias recentes e mais estruturantes conquistadas pela população por meio do congelamento dos investimentos públicos na saúde, educação, previdência e seguridade social e a imposição de uma agenda neoliberal expressa na alteração da legislação trabalhista, na proposta da reforma da previdência e na privatização de Empresas ofertadas amplamente ao mercado e o descaso com das políticas públicas.

Os movimentos populares, sociais, sindicais têm se manifestado por meio de diversas ações públicas, porém sem capacidade para barrar a agenda conservadora e autoritária imposta por um presidente sem credibilidade, com baixos índices de popularidade e com acusações comprovadas de corrupção.

E neste contexto que se coloca o Seminário Etapas 35 anos: Qual o Futuro da Democracia? O evento, que será realizado em 23 de maio, às 18h, no Sindsprev, tem como objetivo fazer o debate sobre os desafios e as estratégicas necessárias para articular força coletiva, tendo como centralidade o fortalecimento da participação popular e a democratização dos meios de comunicação entre as quais as mídias digitais.

Os expositores do evento serão:

  • Silvio Caccia Bava (Diretor e Editor-chefe do Jornal Le Monde Diplomatique)
  • Nataly Queiroz (Jornalista e Doutora em Comunicação Social)
  • Neide Silva (Assistente Social – Etapas – Moderação)

O seminário faz parte da agenda de comemorações dos 35 anos da ETAPAS, que se seguira com encontros, reuniões nos territórios de atuação e a realização das Rodas Temáticas, momento em que se discute questões pertinentes a intervenção institucional.

Inscreva-se

O número representa 17,3 milhões de jovens, aponta estudo da Abrinq

Brasília – Cidade estrutural – Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil

Por Camila Boehm – Repórter da Agência Brasil São Paulo

Mais de 40% de crianças e adolescentes de até 14 anos vivem em situação domiciliar de pobreza no Brasil, o que representa 17,3 milhões de jovens. Em relação àqueles em extrema pobreza, o número chega a 5,8 milhões de jovens, ou seja, 13,5%. O que caracteriza a população como pobres e extremamente pobres é rendimento mensal domiciliar per capita de até meio e até um quarto de salário mínimo, respectivamente.

Os dados são da publicação “Cenário da Infância e da Adolescência no Brasil”, que será divulgado amanhã (24) pela Fundação Abrinq. O estudo relaciona indicadores sociais aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Organização das Nações Unidas (ONU), compromisso global para a promoção de metas de desenvolvimento até 2030, do qual o Brasil é signatário junto a outros 192 países.

“Algumas metas [dos ODS] certamente o Brasil não vai conseguir cumprir, a menos que invista mais em políticas públicas voltadas para populações mais vulneráveis. Sem investimento, fica muito difícil cumprir esse acordo”, avaliou Heloisa Oliveira, administradora executiva da Fundação Abrinq. “Se não houver um investimento maciço em políticas sociais básicas voltadas à infância, ficamos muito distantes de cumprir o acordo”.

Um dos exemplos de metas difíceis de serem cumpridas está relacionada à educação, mais especificamente ao acesso à creche. “Você tem uma meta, que entra no Plano Nacional de Educação [PNE], de oferecer vagas para 50% da população de 0 a 3 anos [até 2024]. Se você não aumentar o investimento e a oferta de vagas em creches – hoje estamos com 27% de cobertura –, não chegaremos em 50% para atender o PNE. Essa é também uma meta dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável [da ONU]”, explica Heloisa.

Outra meta distante do cumprimento é sobre a erradicação do trabalho infantil. “O acordo [com a ONU] prevê que, até 2025, os países erradiquem todo tipo de trabalho escravo e trabalho infantil. Nós [Brasil] ainda temos 2,5 milhões crianças em situação de trabalho. Se não houver investimento na erradicação do trabalho infantil, essa meta certamente não vai ser alcançada”, avaliou.

Jovens vulneráveis

Segundo Heloisa, o relatório ressalta o quanto os jovens são vulneráveis à pobreza.  Ela compara que, enquanto as crianças e adolescentes representam cerca de 33% da população brasileira, entre os mais pobre esse patamar é maior. “Se você fizer um recorte pela pobreza cruzado com a idade, você vai perceber que entre a população mais pobre tem um contingente ainda maior de crianças e adolescentes [40,2%]. Esse é um ponto importante que ressalta o quanto as crianças são vulneráveis à pobreza”, diz.

A representante destaca ainda a importância de analisar os indicadores do ponto de vista regional, uma vez que a média nacional não reflete o que se passa nas regiões mais pobres. Em relação à renda, o Nordeste e o Norte continuam apresentando os piores cenários, com 60% e 54% das crianças, respectivamente, vivendo na condição de pobreza, enquanto a média nacional é de 40,2%.

“Quando olhamos para uma média nacional, tendemos a achar que a realidade está um pouco melhor do que de fato ela está. O Brasil é um país muito grande, muito desigual, então se você olhar os dados regionais, vai ver que as regiões mais pobres concentram os piores indicadores de educação, de acesso à água e saneamento, de acesso a creches, por exemplo”.

Violência

O relatório mostra que 18,4% dos homicídios cometidos no Brasil em 2016 vitimaram menores de 19 anos de idade, um total de 10.676. A maioria desses jovens (80,7%) foi assassinada por armas de fogo. O Nordeste concentra a maior proporção de homicídios de crianças e jovens por armas de fogo (85%) e supera a proporção nacional, com 19,8% de jovens vítimas de homicídios sobre o total de ocorrências na região.

A violência é a consequência da falta do investimento nas outras políticas sociais básicas, segundo Heloisa. “Os outros índices influenciam diretamente a estatística da violência. Se você investir na manutenção das crianças e adolescentes na escola até completar a educação básica – que está prevista na lei brasileira, que seria até 17 anos –, se investir na proteção das famílias, na disponibilização de atividades e espaços esportivos para crianças e adolescentes, você vai ter um número muito menor de jovens envolvidos com a violência”, conclui

Heloisa destaca que há uma relação direta dos altos índices de violência com as estatísticas de pobreza. “A prova de que isso é uma relação direta é que, entre esses 10,6 mil crianças e adolescentes assassinados [em 2016], a maioria deles, mais de 70%, são jovens negros, pobres e que vivem em periferia. Portanto, são adolescentes que vivem em situação de vulnerabilidade social, ou seja, poderia ser evitado com investimento em enfrentamento da pobreza, melhorando a qualidade de moradia, educação e saúde”, acrescenta.

Para reduzir a violência e os homicídios nessa faixa etária, Heloisa alerta que não basta investir em segurança pública. “O melhor indicador da segurança pública é a evasão escolar zero”, diz. Ela cita um estudo, realizado pelo sociólogo Marcos Rolim, do Rio Grande do Sul, com jovens que ficaram na escola e outros que saíram precocemente. “O resultado que ele encontrou é que os jovens que permanecem na escola não se envolvem com violência, portanto, há uma relação direta e o melhor investimento para segurança pública é a escolarização, é a manutenção dessas crianças na escola”.

Os indicadores selecionados para o Cenário da Infância e da Adolescência podem ser encontrados no portal criado pela Fundação Abrinq Observatório da Criança e do Adolescente.